O Supremo Tribunal Federal se posicionou, no início do ano passado, no sentido de que o diferencial de alíquota (DIFAL) do ICMS não poderia continuar a ser cobrado antes que houvesse lei complementar tratando das normas gerais de sua incidência.
O DIFAL do ICMS, vale lembrar, foi criado em 2015, por meio da Emenda Constitucional 87/2015, com o objetivo de tornar mais justa a arrecadação do ICMS pelos Estados, em decorrência, principalmente, do crescente aumento das vendas pela internet. Assim, com base em regras firmadas no CONFAZ (Conselho Nacional de Política Fazendária), nas vendas interestaduais com destino a consumidor final (não contribuinte do imposto), o remetente passou a ser obrigado ao recolhimento de uma parcela do ICMS ao estado de destino.
O posicionamento do STF ocorreu em fevereiro de 2021, ao julgar o Recurso Extraordinário (RE) 1.287.019, cujo teor questionava o fato de que a cobrança do DIFAL estava sendo sustentada por meio de normas infralegais desde a Emenda Constitucional 87/2015, mais precisamente o Convênio ICMS 93/2015.
Na ocasião, o STF deu provimento ao recurso, mas, para que ninguém se prejudicasse, modulou os efeitos daquele julgamento para permitir que a cobrança continuasse da maneira como vinha ocorrendo por todo o restante do ano de 2021, a fim de que fossem criadas as leis necessárias à adequação da cobrança, a partir do ano de 2022.
Era esperado, portanto, que houvesse um empenho da classe política, sobretudo no âmbito federal, para que os Estados não perdessem receitas.
Isso porque, embora o Projeto de Lei Complementar (PLP 32/2021) tenha sido instaurado em 15 de março de 2021, e tramitado a contento pelo Senado Federal, alcançando a Câmara dos Deputados em 06/08/2021 (isto é, a tempo de ser aprovado até o final de setembro, para que seus efeitos fossem aplicados a partir de 1º de janeiro de 2022), a Câmara e o Poder Executivo não deram urgência necessária à matéria.
Até houve requerimento de urgência para a questão no âmbito da Câmara, apresentado em 25 de agosto de 2021; no entanto, a aprovação deste requerimento ocorreu apenas em 23 de novembro daquele ano.
Faltou, também, naquele momento em que o PLP 32/2021 estacionou na Câmara dos Deputados, uma atuação política eficiente do CONFAZ, que já poderia prever o impasse que isso traria aos Estados caso as leis não viessem a tempo.
Uma vez aprovada a urgência, o Plenário da Câmara aprovou a matéria em pouco mais de 20 dias. Todavia, a publicação da Lei Complementar 190 somente veio a ocorrer no dia 05 de janeiro de 2022.
O resultado disso é que, além da necessidade de se respeitar o período de 90 dias para produzir efeitos, nos termos previstos pela própria Lei Complementar 190, nenhuma Lei local instituindo o DIFAL poderá valer durante o ano de 2022, uma vez que o Princípio Constitucional da Anualidade determina que é vedado aos Estados e ao Distrito Federal cobrar tributos no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu.
Já se observa uma movimentação de vários Estados fazendo vista grossa para a ordem legal e sustentando a cobrança, a depender do Estado, a partir de abril de 2022 (respeitando-se, no mínimo, a noventena), ou imediatamente (desrespeitando-se tudo).
Todavia, é fato consumado, desde fevereiro de 2021, que o DIFAL do ICMS é um tributo novo e independente e, pela mesma razão de ter sido determinada a promulgação de lei complementar para sua instituição, devem ser a ele aplicados os princípios da anualidade e da anterioridade nonagesimal.
Diante disso, resta aos contribuintes que realizam operações interestaduais de venda de mercadorias a não contribuintes, buscar auxílio especializado contra esses Estados, a fim de que, durante o ano de 2022, nada lhes seja cobrado a título de DIFAL do ICMS.