A transformação tecnológica tem impulsionado o desenvolvimento da economia digital, e, por consequência, oportuniza o surgimento de novos tipos de ativos econômicos e financeiros, frequentemente alheios à regulamentação existente e aos seus instrumentos de intervenção estatal (a atividade tributária entre eles).
Exemplo notável desse fenômeno são os non-fungible tokens (NFT’s), representações digitais de ativos financeiros em blockchain (token), com identificações únicas e que podem ser livremente negociados, considerando sua raridade, liquidez etc. Eles são criptografados da mesma maneira que as criptomoedas. Ao passo em que as criptomoedas são “tokens fungíveis” (ou seja, “podem substituir-se por outros da mesma espécie, qualidade e quantidade”[1]), porém, os NFT’s (como o próprio nome sugere) são “tokens infungíveis”, pois apresentam características que os tornam insubstituíveis, únicos, representando produtos exclusivos, colecionáveis[2].
O mercado de investimentos recebeu os NFT’s com empolgação.
Em 2021 o então CEO do Twitter, Jack Dorsey, vendeu o seu primeiro tuíte publicado como um NFT por US$ 2,9 milhões[3]. Estima-se que a Bored Ape Yatch Club (BAYC) tenha auferido mais de US$ 2 milhões apenas com a venda do primeiro lote de artes digitais únicas de “macacos entediados”[4].
Ocorre que ainda não há, no Brasil, regulamentação específica para NFT’s.
Embora a Instrução Normativa RFB nº 1.888/2019 tenha disciplinado a obrigatoriedade da prestação de informações relativas às operações realizadas com criptoativos, a definição dada pelo art. 5º da norma excluiu sua aplicação às operações com NFT’s[5].
O projeto de regulação das criptomoedas aprovado pelo Senado em maio deste ano também deixou de fora os NFT’s[6].
Para colmatar essa lacuna, pelo menos no aspecto fiscal, em 2022 a Receita Federal incluiu códigos específicos para declaração de criptoativos na declaração do Imposto de Renda para a pessoa física de 2021, incluindo NFT’s e permitindo o tratamento dos tokens não-fungíveis de forma equiparada a ativos financeiros que podem ocasionar ganho de capital, independentemente da natureza da operação[7].
De todo o modo, essas operações inspiram cautela.
Se, de um lado, a academia reconhece que o desenvolvimento do ecossistema NFT ainda está em seu estágio inicial e que as tecnologias de NFT’s são prematuras[8], de outro, os resultados do mercado dos tokens infungíveis têm se mostrado inconsistentes[9].
Esses fatores, aliados à ausência de regulamentação específica (especialmente a tributária) indicam que as operações com NFT’s são, ainda, cercadas por incertezas e insegurança jurídica – não obstante todo o potencial econômico e financeiro que elas representam na nova economia digital.
[1] Art. 85 do Código Civil.
[2] GAGLIANO, P. S.; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil – Parte geral – vol. 1. 23. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2021.
[3] G1, 2021. Notícia disponível em: http://glo.bo/3baAbeM
[4] Tecmundo, 2022. Notícia disponível em: https://bit.ly/3zTYRm2
[5] Instrução Normativa RFB nº 1.888/2019 disponível em: https://bit.ly/3tMnMEp
[6] Gazeta do Povo, 2022. Notícia disponível em: https://bit.ly/3mZIKMs
[7] G1, 2022. Notícia disponível em: http://glo.bo/3O6a5bp
[8] WANG, Q.; et al. Non-fungible token (NFT): Overview, evaluation, opportunities and challenges:2105.07447, 2021. Disponível em: https://arxiv.org/abs/2105.07447[9] Cointelegraph, 2022. Notícia disponível em: https://bit.ly/3zIBkVi