Tema sensível no Comércio Exterior é a demurrage de contêiner. Mas porque “de contêiner”?
Vem de longa data o empréstimo, ao Direito Aduaneiro e ao Direito Civil, do instituto do Direito Marítimo relativo à sobre estadia, popularmente conhecida como demurrage.
Originalmente tratada e considerada para os navios nos contratos de fretamento, consistia na indenização devido ao fretador pelo atraso na entrega do navio tomado por afretamento. Assim é que se emprestou desse ramo do Direito o conceito da demurrage.
Nitidamente com maiores montas, jamais se utilizou desta para constituir nicho de mercado, como hodiernamente com a demurrage de contêiner.
Hoje, temos absurdas cobranças de valores estratosféricos, principalmente aos equipamentos unitizadores de mercadorias submetidas ao Procedimento Especial de Controle Aduaneiro (PECA).
Sob o pálio argumentativo de que houve a “privação do equipamento ao armador e, por isso, necessária a indenização”, não é, todavia, interesse do armador em ter o contêiner retornado dentro do free time, eis que seu estoque de vazios comumente é abastado e não são algumas poucas unidades que farão a alegada diferença em suas operações.
Tantas são as discussões acerca da abusividade e excesso nas cobranças de demurrage de contêiner que a Agência Nacional de Transportes Aquaviários (ANTAQ), Agência Reguladora do setor, abriu de 21/09 a 16/10/2020, a Tomada de Subsídios Pública nº. 03/2020/SRG-ANTAQ, objetivando: “Obter contribuições e subsídios, por escrito, para a concretização do tema 2.2 da Agenda Regulatória biênio 2020/2021, que busca desenvolver metodologia para determinar abusividade na cobrança de sobre estadia de contêineres”1.
Em nossa opinião, da Nota Técnica nº. 129/2020/GRM/SRG, cujo assunto é a: “Caracterização e instrução inicial do projeto de desenvolver metodologia para determinar abusividade na cobrança de sobre estadia de contêineres”, ainda que pretenda a ANTAQ fazer seu papel, mesmo que tardio, deve iniciar por esclarecer conceitos que, ela própria, não domina. Vejamos:
Interessante observar que a demurrage do contêiner provém de duas situações: 1) atraso na entrega do contêiner ovado para embarque por parte do exportador; 2) atraso na devolução do contêiner desovado por parte do importador. Isto é, a demurrage não está relacionada à mercadoria transportada, mas sim a unidade de carga (contêiner), que consiste em parte do navio.
O atraso no contêiner ovado para embarque é tecnicamente conhecido por “detention”, correspondente ao atraso anterior ao contrato de transporte ou na entrega para o início do transporte, ao passo que a “demurrage” é o atraso na entrega da unidade posterior ao contrato de transporte ou na devolução para a finalização do contrato.
Solução relativamente simples a ser satisfatória às partes (armadores e importadores) e a pacificar o tema, seria o free time iniciar, no dia seguinte à confirmação da descarga, nos termos do inciso II do Art. 20 do Anexo Único da Resolução Normativa ANTAQ nº. 18/2017, suspendendo-se no registro da Declaração de Importação e retornando após a emissão do Comprovante de Importação. Assim, eventual privação do cofre de carga seria cobrada da Receita Federal via FUNDAF (Fundo de Aparelhamento das Atividades de Fiscalização), desonerando quem menos tem responsabilidade na maioria dos casos: os importadores.
À toda evidência, teremos novas interpretações e teses surgindo, abrindo-se novos horizontes aos importadores que, atualmente, apenas são compelidos a pagar pelas “práticas de mercado”, ainda que predatórias, e pelos “usos e costumes” do comércio internacional.